Africadas [ts] E [dz] No Português Sergipano

  • Autor: Antônio Félix de Souza Neto
  • Editora: Editora Dialética
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Sinopse

Neste livro, descrevemos a gramática das realizações africadas alveopalatais [tS] e [dZ] no português falado por sergipanos com idade igual ou acima de 60 anos: nessa variedade do português, as realizações africadas [tS] e [dZ] estão restritas a alguns itens lexicais de natureza onomatopaica e antroponímica e a contextos em que o aproximante palatal adjacente [j] de ditongo dos tipos vogal+[j] e [j]+vogal é esperado. Nosso tratamento quantitativo (estatístico/probabilístico) com o software R demonstrou que, embora em variação com suas contrapartes oclusivas (dento)alveolares plenas [t] e [d] e africada alveolar [ts] nos referidos contextos de ditongo, as africadas alvopalatais ([tS] e [dZ]) são quase categóricas, predominando em 94% dos dados da nossa pesquisa. Evidências acústicas apontam uma correlação sistemática entre monotongação ou o apagamento do aproximante palatal [j] adjacente (precedente ou seguinte) dos decursos vogal+[j] e [j]+vogal – e as realizações africadas alveopalatais ([tS] e [dZ]). Constatamos que, tanto nos itens lexicais de natureza onomatopaica e antroponímica quanto nos contextos em que o aproximante palatal [j] é apagado da superfície, as africadas [tS] e [dZ] têm potencialidades contrastivas (fonêmicas/fonológicas) no léxico dessa variedade. A partir dessas constatações, levantamos a hipótese de que essas restrições fazem parte de uma gramática das africadas ([tS] e [dZ]) que tem a propriedade de preservar o léxico. A regra generalizante dessa gramática pode, pois, ser deduzida nos seguintes termos: as realizações africadas alveopalatais [tS] e [dZ] se restringem a alguns itens lexicais de natureza onomatopaica e antroponímica e a contextos nos quais o gatilho ([j]) que dispara a regra (africação) da qual [tS] e [dZ] resultam pode ser apagado logo em seguida. À luz da Fonologia Autossegmental, tal como documentada em Goldsmith (1995), nos itens lexicais em que o gatilho ([j]) do processo do qual resulta não figura na adjacência, estamos interpretando a realização [tS] como africada plena e, por conseguinte, "segmento de contorno" ([tS]); já em contextos em que o aproximante palatal [j] de ditongo (incluindo aqueles que podem ocorrer por inserção (epêntese) desse aproximante palatal [j]) dos tipos vogal+[j] e [j]+vogal é esperado, entendemos que essas realizações africadas podem ser interpretados como "segmentos complexos" ([tJ] e [dJ]) ou "de contorno" ([tS] e [dZ]), resultantes de um único processo – espraiamento bidirecional de traços do aproximante palatal [j] esperado – que gera uma articulação [palatal] menor/secundária ([J]) ou um segmento fonético fricativo [palatal] ([S] ou [Z]) intruso. Nos termos da Fonética Articulatória (BARBOSA; MADUREIRA, 2015), essa interpretação é compatível com coarticulação preservatória ou antecipatória de traços do aproximante [j]. À luz da Fonética Acústica – tal como documentada em Ladefoged e Maddieson (1996), Ladefoged (2001), Ladefoged e Johnson (2011), Barbosa e Madureira (2015) e Kent e Read (2015) – trata-se de um segmento em duas fases (oclusão e fricção) sucessivas. Com os recursos do software PRAAT, testamos nossa hipótese de a interação do apagamento do aproximante palatal [j] com a africação alveopalatal de /t/ e /d/ coincidir com um alongamento compensatório dos segmentos africados [tS] e [dZ] adjacentes. Concluímos que as restrições dessa gramática se justificam pela correlação do traço [palatal] do aproximante [j] com [tS] e [dZ] e pelas potencialidades contrastivas (fonêmicas/fonológicas) destas africadas na variedade do português falado pelos sergipanos idosos. O produto final desta tese dá as dimensões qualitativa e quantitativa à pesquisa que lhe dá ensejo.